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Pesquisa em esgoto de Belo Horizonte aponta uma maior prevalência da Covid-19 na população

Projeto Monitoramento Covid Esgotos estima que número de infectados pode ser 18 vezes maior que o apurado

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O sexto boletim emitido pelo projeto-piloto Monitoramento Covid Esgotos mostra o quão poderosa pode ser essa ferramenta epidemiológica. Após oito semanas analisando o esgotamento sanitário de diversas regiões de Belo Horizonte, a equipe estimou que mais de 50 mil pessoas na região podem estar infectadas com o novo coronavírus, número quase 18 vezes superior ao divulgado pelos boletins epidemiológicos da Secretaria de Saúde do Estado. Isso porque a técnica consegue avaliar a carga genética do vírus dos dejetos de pessoas que são assintomáticas, ou seja, aquelas que carregam o coronavírus, mas não manifestaram os sintomas da doença.

O projeto é conduzido pela Agência Nacional de Águas (ANA) e pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Estações Sustentáveis de Tratamento de Esgoto (INCT), da UFMG, em parceria com a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA), o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM) e a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG).

O último boletim divulgado pelo projeto trouxe resultado das amostras de esgoto coletadas nos sistemas de esgotamento sanitário das bacias do Arrudas e do Onça, em Belo Horizonte e Contagem (MG), o que apontou novo crescimento na detecção da Covid-19 no esgoto. 

Sérgio Ayrimoraes, superintendente de planejamento de recursos hídricos da ANA, explica que o objetivo do projeto era saber se seria possível a detecção e quantificação do coronavírus em amostras de esgotos. Como isso se mostrou efetivo, é chegada a hora de uma segunda etapa do projeto, ou seja, fazer com que a outra parceira, a Secretaria de Saúde, possa usar esses dados para melhorar as estratégias de enfrentamento da pandemia, como por exemplo o fortalecimento ou abrandamento do isolamento social.

“Agora temos como fazer uma estimativa da população infectada a partir dessa amostragem. Um dos principais objetivos do projeto é esse monitoramento indireto da população para que possamos estimar as pessoas infectadas, incluindo até as que não manifestaram os sintomas da doença, que são os portadores assintomáticos”, explica o superintendente.

Juliana Calabria, professora do Departamento de Engenharia Sanitária Ambiental da UFMG e uma das coordenadoras do projeto, explica que o que se pôde observar com esses últimos resultados foi uma evolução, um aumento no número de amostras que testaram positivo para a presença do material genético do coronavírus. 

“Isso quer dizer que aumentou a circulação do vírus em diferentes regiões onde fazemos o monitoramento, o que representa diferentes bairros da região de Belo Horizonte. Quando fizemos o cálculo da estimativa da população infectada baseada na carga viral encontrada no esgoto, vimos que nessas regiões a prevalência da doença, ou seja, o número de pessoas infectadas é maior.”

O último boletim comparou a população infectada estimada e o número de casos confirmados da Covid-19 divulgados pelos boletins epidemiológicos da prefeitura de Belo Horizonte. Segundo Juliana, na semana 7 o número de casos clínicos confirmados eram de 2.129 e estimativa do monitoramento para o mesmo período, baseado na carga viral do esgoto foi dez vezes superior, ultrapassando os 23 mil casos. Nesta última semana, o informe foi de que havia pouco mais de 2.800 infectados na região, mas a estimativa do projeto apontou que o número de infectados ultrapassou a barreira de 50 mil.

Ainda segundo dados do boletim, a estimativa de população infectada chegou a 11,7% da população atendida por uma das sub-bacias de esgotamento analisadas. Na semana anterior, cujas as coletas ocorreram de 1º a 5 de junho, a estimativa era de que 6,9% da população atendida estaria infectada pelo novo coronavírus.

Alternativa à baixa testagem
A especialista explica que a testagem direta, ou seja, clínica, é muito baixa no Brasil, assim, as estimativas do projeto conseguem mostrar a real prevalência da doença é maior. No entanto, ela ressalta que essa coleta no esgoto é uma testagem indireta, ou seja, serve como uma ferramenta complementar de vigilância epidemiológica. 

“Como estamos fazendo amostragem em diferentes regiões, temos ao longo do tempo, um acompanhamento da evolução da circulação do vírus nessas diferentes localidades, o acompanhamento do número estimado de pessoas infectadas. Com os parâmetros que adotamos, que são parâmetros conservadores, podemos ter uma ideia da disseminação do vírus, já que a testagem clínica é muito baixa”, ressalta.

Como a prevalência naquelas regiões foi apontada como alta, a Secretaria de Saúde de Minas Gerais pode, agora, de posse dessas informações, intensificar ações nesses diferentes bairros. Dentre as ações estão o aumento da testagem clínica na população dessas regiões específicas, os inquéritos epidemiológicos ou até mesmo a aplicação de testes sorológicos rápidos. “A ideia é que a secretaria se aproprie desses dados para que possa nortear mais ações de enfrentamento, ou ainda direcionar esforços para uma área mais específica”, relata.

Em outros estados
Já existem outras várias iniciativas no Brasil. O projeto é da Agência Nacional de Águas e INCT da UFMG. Como outras sete universidades federais são parceiras do instituto mineiro, elas também já começaram a fazer coletas de amostras nas suas respectivas cidades. A Universidade Federal de Pernambuco ainda vai começar a coletar amostras, mas outras unidades em outros estados, como Paraná, São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro já iniciaram o monitoramento dos esgotos, algumas delas amparadas na expertise da UFMG. 

“Infelizmente ainda não há uma articulação nacional coordenada e integrada”, lamenta Juliana. “Esperamos que isso possa acontecer.”
Sérgio Ayrimoraes, superintendente da ANA, explica que o projeto tem se mostrado como um indutor de outras ações que também estão acontecendo no país, que é outro objetivo desse projeto piloto. 

“A ANA, com abrangência de caráter nacional, tem essa preocupação, seja de apoiar, seja de acompanhar, seja servir de exemplo para que outras regiões adotem os protocolos, os procedimentos, a metodologia e a gente tenha uma estratégia que não se restringe a uma só região, como Belo Horizonte, mas que possa compor uma estratégia de caráter mais amplo nacionalmente”, aponta.

Segundo Sérgio, o Ministério da Saúde já tem recebido as informações de todas as regiões que estão desempenhando projetos similares para somar às estratégias nacionais que estão sendo criadas, mas, por enquanto, não há planos para uma estratégia nacional de monitoramento do esgoto em relação à Covid-19. 
 

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