Foto: divulgação
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De adolescente a articulador: jovem de Pé de Serra (BA) conta como comunidade se uniu para tentar o Selo UNICEF pela segunda vez

Essa é a terceira vez que o município baiano participa da iniciativa; porém, na edição passada, não alcançaram a certificação. Na Bahia, outros 248 municípios trabalham para garantir direitos de crianças e adolescentes locais

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A história de Raphael Rios, de 25 anos, se confunde com a do município de Pé de Serra (BA). O jovem já esteve nas duas pontas da iniciativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância, voltada para o Semiárido e a Amazônia Legal: o Selo UNICEF. A partir de desafios cumpridos, os municípios participantes recebem, após três anos, um selo que comprova o esforço da comunidade em colocar crianças e adolescentes como prioridade no local.
 
Raphael já foi o adolescente que precisou ter seus direitos garantidos e hoje é quem garante esses direitos a outros jovens. “É outra responsabilidade. É preciso filtrar e adequar os pontos para a realidade de cada menino e menina, torná-los protagonistas. Meu papel agora é esse. No passado, fizeram isso por mim e agora é minha vez de fazer isso por alguém”, revela o articulador.  
 
Fazer parte da história de crianças e adolescentes de Pé de Serra tem um motivo especial para Raphael. No passado, ele conta que sofreu com estereótipos. “Primeiro, porque sou nordestino. Depois, porque fui um jovem da zona rural, e há um preconceito com isso dentro da cidade”, comenta. “Enquanto adolescente, na época do Selo, as pessoas questionavam por que pegar um jovem ‘da roça’ para participar, como se não fôssemos capazes”, lembra.
 

 
Mas essa realidade foi transformada após as ações do Selo UNICEF. O articulador comenta que as atividades, as viagens e a experiência adquirida das edições anteriores ajudaram-no a não desistir. “Hoje, tenho essa ideia de que não posso – e nem devo – estereotipar ninguém. Devo acolher cada adolescente que chega, ver o que cada um tem de bom para oferecer e adequar às realidades. Se eu não tivesse a experiência do passado, não conseguiria fazer nada disso”, acredita.
 
Racismo
Atuando também como coordenador de enfrentamento ao racismo, Raphael Rios destaca essa ação como uma das mais exitosas nessa atual edição do Selo. Para ele, isso permitiu conhecer realidades que ele nem imaginava que existiam em Pé de Serra.

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“A gente achou que vivia uma situação totalmente utópica. Quando o NUCA foi às escolas chamar mais jovens para participar do Selo, nos deparamos com várias realidades. Meninas que não aceitavam o próprio corpo, o próprio cabelo, de meninos que não se aceitavam como eram”, diz.
 
 
Foi então que realizaram um desfile afro que devolveu a meninas e meninos a autoestima e a autoaceitação. “As crianças e adolescentes se sentiram muito representados, isso me marcou muito”, emociona-se Raphael.
 
A especialista na área de Desenvolvimento de Adolescentes e Jovens do UNICEF para o Semiárido, Luiza de Sá Leitão, reforça a importância de se trabalhar a autoestima de meninas e meninos negros. A especialista revela que muitas adolescentes “libertaram” os cabelos crespos de químicas e hoje se sentem mais felizes com a decisão.
 
“Os núcleos de jovens são decisivos nisso”, crava Luiza. Meninas que foram vítimas de bulimia (transtorno alimentar compulsivo que leva a pessoa a provocar vômito, por exemplo, para evitar o ganho de peso) também se aceitaram por meio dos encontros e hoje já não buscam mais o corpo “perfeito”.
 
Raphael afirma que a representatividade é essencial para ele e para esses jovens. “Foi importante para eles verem que há jovens como eles em posição de liderança, de destaque, de protagonismo.”
 

 
Ações na Bahia
No ciclo de 2017-2020, Bahia teve 249 municípios participantes nas ações do Selo – 53 a mais do que na edição passada, que teve 196. Desses, 28 municípios foram certificados.
 
Essa é a terceira vez que o município de Pé de Serra participa da iniciativa do UNICEF. No entanto, será a chance de conquistar a segunda certificação, já que na edição de 2013-2016 o município não conseguiu cumprir todos os desafios. “Nesse atual ciclo, conseguimos uma participação maior de adolescentes e crianças e trabalhar de forma intersetorial, que acho que foi o que faltou na edição passada”, reconhece.
 

 
“É importante que todo o município esteja engajado e trabalhando para alcançar os resultados sistêmicos propostos pelo Selo, mas sobretudo que estejam engajados para garantir direitos para cada criança e cada adolescente”, propõe a oficial de Educação do UNICEF no Brasil, Julia Ribeiro.
 
O Selo
Implantado pela primeira vez em 1999, no Ceará, o Selo UNICEF já contabiliza 20 anos de história e de mudança na vida de milhões de crianças e de adolescentes em situação de vulnerabilidade no Semiárido e na Amazônia Legal. Atualmente, 18 estados são alcançados pela ação – Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e norte de Minas Gerais, no Semiárido, e Acre, Amazonas, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, na Amazônia Legal.
 
Saiba mais: Selo UNICEF encerra ciclo de ações e convoca municípios do Semiárido e Amazônia Legal a apresentarem resultados
 
Com o sucesso das experiências, o Selo cresceu e, hoje, procura aplicar o aprendizado das edições anteriores aos participantes da atual. A metodologia foi unificada para o Semiárido e Amazônia Legal e introduziu o conceito de Resultados Sistêmicos no lugar de ações, visando dar sustentabilidade às iniciativas dos municípios e garantir que as crianças e adolescentes continuem sendo beneficiadas pelas políticas públicas implementadas mesmo após o fim do ciclo.
 

 
O Selo é dividido em ciclos, que coincidem com as eleições municipais. No atual ciclo (2017-2020), 1.924 municípios aceitaram o desafio, sendo 1.509 do Semiárido e 805 da Amazônia Legal. Cumprindo as metas propostas pela ação, o município recebe, após três anos, um selo que comprova e reconhece o esforço da comunidade envolvida.

No ciclo de 2017-2020, os municípios devem apresentar os resultados das ações desenvolvidas até 30 de junho (prazo prorrogado), por meio da plataforma Crescendo Juntos, no site do Selo UNICEF. A comprovação das atividades é feita por meio de documentos comprobatórios e anexados no portal. O envio pode ser feito pelo computador, celular ou tablet ou com auxílio de agentes comunitários, caso o município não tenha acesso à internet.

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