Deputado Alceu Moreira (MDB-RS) é relator da MSC 245/12, que pede a ratificação do Protocolo de Nagoya/ foto: Agência Câmara
Deputado Alceu Moreira (MDB-RS) é relator da MSC 245/12, que pede a ratificação do Protocolo de Nagoya/ foto: Agência Câmara

Câmara deve votar nesta quarta (1) acordo internacional que prevê acesso a recursos genéticos e repartição de benefícios

Protocolo de Nagoya foi assinado pelo Brasil em 2012, mas ainda não foi ratificado; tratado estabelece que países utilizem recursos genéticos e dividam lucros gerados

SalvarSalvar imagemTextoTexto para rádio

Após anos de espera, o Protocolo de Nagoya pode ser finalmente ratificado. A previsão do relator da Mensagem de Acordos, Convênios, Tratados e Atos Internacionais 245/2012, deputado Alceu Moreira (MDB/RS), é que isso ocorra nesta quarta-feira (1). O texto, que visa reconhecer o acesso à biodiversidade e à repartição de benefícios por países que a utilizam, tramita na Câmara dos Deputados há quase dez anos e ganhou fôlego nas últimas semanas. 

O acordo estabelece as diretrizes para as relações comerciais entre o país provedor de recursos genéticos e aquele que vai utilizar esses recursos, abrangendo pontos como pagamento de royalties, estabelecimento de joint ventures (termo econômico utilizado para designar a cooperação econômica ou estrutural entre duas ou mais empresas), direito a transferência de tecnologias e capacitação. “Participar do Protocolo de Nagoya nos daria autonomia e direito de definir nosso próprio destino”, avalia o parlamentar. 

Firmado em 2010 pela Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), durante a COP 10, o Protocolo de Nagoya contou com o Brasil na lista dos quase 100 assinantes, ainda em 2012. O problema desde então é que o Parlamento até hoje não ratificou o acordo, o que faz com que o país não participe efetivamente do tratado. 

Segundo Alceu Moreira, a ratificação do acordo permitiria aos brasileiros a participação em reuniões internacionais para debater e estipular o acesso aos recursos genéticos, como sementes, plantas e animais. “Exemplos desses benefícios podem ser o desenvolvimento de novas cultivares agrícolas, mais adaptadas e resistentes, aumentando nossa produtividade e o desenvolvimento de novos medicamentos e de novos produtos que podem surgir do desenvolvimento tecnológico da utilização desses recursos genéticos”, aponta.

O deputado assegura que há esforço das frentes parlamentares da Agropecuária e Ambientalista para que a matéria seja analisada com urgência. “O tema está pautado para quarta-feira (1º) como primeiro item da pauta do plenário. Acreditamos que a matéria será votada e aprovada”, adianta. 

Em seu relatório, Moreira afirma que “a redução da biodiversidade e a perda dos serviços ecossistêmicos constituem uma ameaça global ao futuro de nosso planeta e de nossas gerações. (...) Ao reforçar a segurança jurídica e promover a repartição de benefícios, o Protocolo de Nagoya incentiva o avanço das pesquisas sobre recursos genéticos que podem levar a novas descobertas. O Protocolo de Nagoya também cria incentivos para a conservação e uso sustentável dos recursos genéticos e reforça, portanto, a contribuição da biodiversidade para o desenvolvimento e bem-estar humano”, argumenta.

Na opinião do advogado e professor de direito ambiental João Emmanuel Cordeiro Lima, o Brasil só tem a ganhar com a ratificação desse protocolo. “Quando a gente olha para o objetivo de Nagoya e olha para a quantidade de biodiversidade que o Brasil tem, a resposta está aí. Quando a gente coloca esses dois fatores na equação, a gente vê que o Brasil tende a ganhar com o tratado, que vai promover a repartição de benefícios pela utilização de recursos genéticos”, acredita.

Cordeiro Lima exemplifica os ganhos que o país teria citando as empresas farmacêuticas. “Hoje, temos uma série de indústrias farmacêuticas que buscam soluções para o combate de doenças. Muitas dessas soluções podem vir do estudo de espécies da biodiversidade. Uma farmacêutica alemã, por exemplo, pode vir ao Brasil estudar uma espécie e, com isso, desenvolver um medicamento para combater uma doença”, ilustra. 

Nesse caso, como o Brasil seria o país de origem dessa biodiversidade, o especialista esclarece que o protocolo asseguraria que essa indústria farmacêutica tenha acesso aos nossos recursos de acordo com a nossa legislação. “Ao final, ela repartiria com nosso país uma parcela dos benefícios, como parte do lucro que ela venha a obter com a venda do medicamento”, completa. 

Ganhos 

O protocolo também é citado no Relatório Luz da Agenda 2030, que reúne especialistas de diversos setores na tentativa de promover o desenvolvimento sustentável, o combate às desigualdades e às injustiças e o fortalecimento de direitos universais e indivisíveis com base no pleno envolvimento da sociedade civil. 

Dentro dos objetivos (ODS 15), o Protocolo de Nagoya é mencionado na tentativa de “proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade.” A recomendação do relatório é de ratificar o quanto antes o acordo, para “regulamentar o acesso a recursos genéticos e a repartição justa e equitativa dos benefícios advindos de sua utilização.”

João Emmanuel Cordeiro Lima afirma que 124 países já ratificaram o protocolo – dentre eles, grandes parceiros comerciais do Brasil, como União Europeia, China e México. “Esse clube já ficou grande mais para a gente ficar de fora. Temas sensíveis, como acesso a recursos genéticos em bancos de dados, devem ser discutidos agora e o país precisa sentar e defender suas posições estratégicas”, enfatiza.

Se for aprovada a ratificação do Protocolo de Nagoya na Câmara dos Deputados, o texto ainda precisa do aval dos senadores.

Receba nossos conteúdos em primeira mão.